terça-feira, 21 de julho de 2009

Poesia do papai, com foto da filha

A lua é minha!

Chegamos à Lua!
Incrível, senhores!
Retumbam tambores
Saudando os heróis

Que voltam, triunfantes
De infinitas alturas,
Vencendo lonjuras
Varando arrebóis!

Os homens exultam,
E em festas ruidosas
Envolvem de rosas
Os reis da amplidão.

No instante em que o bando
Mil céus vai pisando,
Apenas fitando
Da Lua o clarão …

Na Lua eu já ando
Há anos sem fim,
Mas nunca de mim
Ninguém se lembrou …

Viajo às estrelas,
Navego aos planetas,
Conheço cometas
E anônimo sou …

Não subo em foguetes …
Meu módulo é o verso
Apenas imerso
Na luz do luar …

E sempre que entendo
Me lanço ao infinito
Num vôo bonito …
Que lindo é sonhar!

Da Lua que eu ponho
Nos versos que faço
Não tiro pedaço
E amostras infestas …

Suas ermas crateras,
Seus lúgubres mares
São mortos luares
De velhas serestas.

“A Lua é nossa!”
Proclamam, realistas
Os tais cientistas …
Que farsa completa!

Pois fiquem sabendo,
Ilustres doutores,
Que a Lua, senhores,
Pertence ao poetas!

(Emir Bemerguy, julho de 1969, para marcar a chegada do homem à lua. O Blog do Jeso publicou, e eu repito, com o devido direito de filha).

quarta-feira, 15 de julho de 2009

Relicário

“...o que não foi fotografado, corre o risco de se afogar na sombra incerta da lembrança.”
(Ítalo Calvino, em “Amores Difíceis)


Dias em que tenho pensado muito sobre fotografia me fizeram remexer o baú de imagens. Achei essa, que foi descoberta pelo meu irmão Emir, que tratou de reproduzir por meio eletrônico a todos os “interessados”. Ali aparecemos, jovens, crianças. Os primos Paulo e Maísa. Meus irmãos, Emir, Toninho e Lucio. A prima Betinha. O vovô Vidal e a vovó Didó, pais do meu pai, Emir. E um outro, que não sei quem é. E eu, a menorzinha, de vestido branco. Não lembro daquele momento. Mas era de festa. Natal, com certeza. As crianças têm presentes nas mãos.

Quando vi essa fotografia, tal seu poder de revelação da memória, foi como se me visse ali, de novo, na casa da vovó Didó, na rua da frente de Santarém, brincando no pátio com os primos, ouvindo de vez em quando um “pô-pô-pô” que vinha no rio, sabe-se lá pra onde. O som do barco, do radinho de pilha do vovô ouvindo o jogo, das histórias tiradas dos romances contadas pela vovó, do carinho sem fim da tia Edith, com aquele sorrisão e sua voz doce. Todos se foram. Vovô, vovó e a tia, que nem está na foto. Mas a foto a trouxe também.

Recordo de um acontecimento dos mais felizes, que os outros também devem ter na memória. O vovô Vidal, sério quase sempre, de poucos carinhos com os pequenos, mas de uma enorme atenção. No Natal, nos levava, eu e os outros netos, a uma loja para escolha do presente. Que alegria nos dava. Nos tempos apertados, papai e mamãe com esforço pra presentear os sete filhos, o vovô demonstrava o homem bom e amoroso, por traz da dureza do semblante.

Esse sentido da fotografia, se ser um objeto que aponta lembranças é para mim, talvez o seu mais forte poder. Roland Barthes, na Câmara Clara, diz “mostrem suas fotos a qualquer pessoa; ela mostrará também as suas: olhe, aqui está o meu irmão; ali sou eu quando era pequeno, etc. A fotografia nunca é mais do que um canto alternado de, Olhe, Veja, Aqui está”. O poeta Rilke, nas suas “Cartas a uma amiga veneziana”, escreve: “Cara e bela amiga, pela primeira vez só, diante do teu retrato, envolvo-me no silêncio da noite e te escrevo...contemplo tua beleza como qualquer jovem a quem se conta uma linda história de fadas”.